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Operação França

por Graciliano Rocha

Perfil Graciliano Rocha é repórter e vive em Paris

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O Palocci de François Hollande

Por grocha
04/04/13 06:57

Antes de ser um dos principais ministros do governo de esquerda, ele ganhou uma fortuna com uma suposta bolsa-consultoria. Jornalistas acharam os rastros do surpreendente enriquecimento do ministro e publicaram. Ele tentou sobreviver no cargo, mas acabou caindo.

Terminam aí as semelhanças entre os escândalos que abateram Antonio Palocci, no Brasil, e o ex-ministro do Orçamento da França, Jérôme Cahuzac, que nesta semana admitiu ser titular de contas bancárias no exterior.

O que se seguiu depois a cada um dos escândalos mostra uma enorme distância entre a cultura política e o funcionamento das instituiçoes nos dois países.

Em maio de 2011, a Folha revelou que Palocci aumentou em 20 vezes o seu patrimônio entre 2006 e 2010. No período, ele exercia atividades de consultor privado.

À época, o então ministro-chefe da Casa Civil alegou sigilo para não revelar sua lista de clientes. O potencial conflito de interesse entre sua atividade privada e suas funções, que envolvem poderes sobre todas as áreas do governo, forçou sua queda, em junho de 2011.

Em dezembro de 2012, o jornal digital “Mediapart” revelou que Cahuzac mantinha contas bancárias no exterior sem declarar ao fisco. Como ministro do Orçamento, ele era o responsável por combater fraudes fiscais.

Cahuzac negou a existência das contas ao presidente François Hollande, ao parlamento e à imprensa. Mesmo assim, o Ministério Público abriu uma investigação sobre o caso em janeiro deste ano.

Em março, ele deixou o cargo e na última terça, acuado pelo processo judicial, parou de mentir e admitiu ter movimentado 600 mil euros (R$ 1,56 milhão) em contas na Suíça e em Cingapura.

O dinheiro, segundo admitiu, era proveniente do pagamento de consultorias prestadas à indústria farmacêutica nos anos 1990.

Palocci recebeu apenas uma “censura ética” da Comissão de Ética Pública da Presidência da República. Na prática, não implica nenhuma restrição prática: ficou apenas um registro formal de que ele teve problemas éticos, mas ele pode ainda ser nomeado para cargo público. Não foi alvo de nenhuma investigação formal, que poderia ou não resultar em processo judicial, sobre a origem dos recursos.

Cahuzac foi indiciado por fraude fiscal e lavagem de dinheiro e pode acabar na cadeia. Seu mundo caiu: o presidente Hollande disse, na televisão, que seu ex-ministro enganou todas as altas autoridades do país e “ultrajou a República”. O Partido Socialista o expulsou e não há clima político para que Cahuzac reassuma a sua cadeira de deputado na Assembleia Nacional. Transformou-se em pária da vida pública. E, note-se, o processo em curso ainda não resultou em condenação.

QUEM SERÁ ARRASTADO COM CAHUZAC?

O destino oposto de dois ex-ministros derrubados por suspeitas é simbólico, mas não é o mais importante. A questão é quem mais Cahuzac vai arrastar junto com ele.
O escândalo estourou dentro do Eliseu (sede da presidência) e agora a imprensa já começa a apurar se houve uma rede de proteção para beneficiar Cahuzac desde dezembro.

O ministro das Finanças, Pierre Moscovici, entrou na linha de tiro e tem sido questionado sobre os controles fiscais que falharam (ou protegeram?) o ex-colega Cahuzac. Os opositores da UMP (centro-direita) pediram a demissão de Moscovici.

“Ninguém sabia [que Cahuzac tinha contas no exterior]. Nem o presidente da República nem o primeiro-ministro nem eu mesmo. Àqueles que dizem que nós não poderíamos não saber, eu apresento um desmentido categórico”, disse Moscovici ao jornal “Le Monde”. O ministro admitiu, contudo, ter “pecado por excesso de confiança” nos desmentidos do colega.

No popular programa de entrevistas de Jean-Jacques Bourdin (BFM TV), o ministro do Interior, Manuel Valls, também foi inquirido, em termos bastante duros agora há pouco, sobre por que os serviços de inteligência que chefia não foram atrás das pistas dadas pelo “Mediapart” em dezembro.

Serviços de inteligência poderiam, em tese, descobrir as contas e avisar Hollande para que ele demitisse Cahuzac rapidamente, evitando o tsunami político que se formou desde anteontem.

Valls desconversou e disse que a inteligência do país estava engajada na “luta contra a ameaça terrorista”. Crescem os questionamentos de leniência dos serviços de inteligência comandados por Valls.

O TESOUREIRO

Em pleno escândalo Cahuzac, o jornal “Le Monde” revela na sua edição de hoje que o tesoureiro da campanha de Hollande em 2012, Jean-Jacques Augiers, 59, figura como acionista de duas empresas offshore nas ilhas Cayman, paraíso fiscal no Caribe.

Não há qualquer relação com o caso do ex-ministro do Orçamento, mas certamente não ajuda nada no esforço de Hollande de tentar recuperar a confiança dos franceses no governo socialista.
Os negócios de Augiers nas Cayman apareceram numa investigação do “Le Monde” com base nos dados obtidos pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês).

A Folha de hoje traz reportagem explicando detalhes da maior investigação jornalística já feita (por repórteres de 46 países) sobre como funciona a lavanderia internacional de capitais nos paraísos fiscais. Clique aqui para ler a reportagem e aqui para ler a análise de Marcelo Soares sobre o assunto.

Mais sobre escândalo Cahuzac:

Escândalo de conta secreta estoura no colo de Hollande

Mentiras de ex-ministro geram nova crise para Hollande

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Escândalo de conta secreta estoura no colo de Hollande

Por grocha
03/04/13 08:27

O escândalo de Jérôme Cahuzac, ex-ministro do Orçamento que admitiu ter contas secretas no exterior, estourou dentro do palácio do Eliseu. Agora há pouco, 12h30 em Paris (7h30 em Brasília), sob pesada artilharia da oposição e críticas da imprensa, o presidente François Hollande veio a público para fazer um pronunciamento duro.

O caso tem um potencial devastador para o governo socialista. No ministério que ocupou até o mês passado, Cahuzac era responsável por combater a sonegação. Ontem, admitiu ter 600 mil euros que circularam por contas da Suíça e Cingapura. Ele foi indiciado por fraude fiscal e lavagem de dinheiro.

“Ele enganou as autoridades do país: o chefe de Estado, o parlamento e, através deles, todos os franceses. É uma falta imperdoável e um ultraje contra a República”, disse Hollande.

No pronunciamento, o presidente também respondeu às críticas que começaram a pipocar sobre o seu suposto conhecimento dos malfeitos do ex-ministro. “Jérôme Cahuzac não se beneficiou de nenhuma proteção, exceto a presunção de inocência”, disse o presidente.

Se a sonegação de impostos é objeto de processo judicial, o maior estrago político veio dos meses de mentiras de Cahuzac. Fez isso em um encontro privado com Hollande, na Assembleia Nacional e em diversas entrevistas.

As contas secretas foram reveladas em dezembro pelo jornal digital “Mediapart” e, até ontem, ele vinha negando veementemente sua existência e prometendo processar jornais que as noticiaram.

A oposição debita o escândalo na conta pessoal de Hollande. “A questão que todos os franceses se poem é François Hollande e [o primeiro-ministro] Jean-Marc Ayrault sabiam ou não das mentiras de Cahuzac?”, disparou o presidente da UMP (centro-direita), Jean-François Copé, agora há pouco ao canal BFM TV, logo após o pronunciamento de Hollande.

A presidente da Frente Nacional (extrema-direita), Marine Le Pen, subiu ainda mais o tom agora há pouco. Em entrevista a emissoras de rádio e TV, ela pediu a dissolução da Assembleia Nacional e realização de uma nova eleição parlamentar para a escolha de um novo primeiro-ministro.

“O nível de desconfiança dos franceses no governo e na classe política é hoje total. É necessário fazer uma nova eleição para que o povo francês possa se expressar”, disse ela.

O escândalo Cahuzac fragiliza ainda mais a situação política do presidente. Pesquisas recentes apontam que somente um terço dos franceses aprovam a conduta de François Hollande no Eliseu.

O descontentamento está ligado ao fato da economia patinar: o desemprego atingiu o patamar mais alto desde 1997 e o governo não conseguiu baixar o déficit das contas públicas nem o endividamento do Estado.

Leia também: Mentiras de ex-ministro geram nova crise para Hollande

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Mentiras de ex-ministro geram nova crise para Hollande

Por grocha
03/04/13 04:56

A confirmação de que o ex-ministro do Orçamento, Jérôme Cahuzac, mantém 600.000 euros escondidos em uma conta no exterior abriu uma crise com alto potencial de estrago para o presidente da França, François Hollande.

Comparado ao ex-ciclista Lance Armstrong pelo desembaraço com que mentia diante de câmeras e microfones, Cahuzac caiu em desgraça e foi abandonado pelos colegas do Partido Socialista e é fustigado pela oposição à direita e à esquerda.

Em nota, o palácio do Eliseu (sede da presidência) disse que as mentiras são uma “grave falta moral”. Como ministro do Orçamento, Cahuzac era também o responsável por elaborar políticas de combate às fraudes fiscais que ele próprio cometia.

Cahuzac deixou o cargo no mês passado, mas apenas ontem admitiu ser o titular do dinheiro que circulou numa conta do UBS na Suíça e depois em um banco de Cingapura. Após ser indiciado por lavagem de dinheiro, o ex-ministro pediu perdão e disse estar “devastado pelo remorso” em seu blog.

O caso veio à tona em dezembro, revelado pelo jornal digital Mediapart. Na Assembleia Nacional, Cahuzac negou a existência da conta no exterior e prometeu processar quem divulgou a informação. Nas entrevistas que concedeu, o então ministro subia o tom para se defender alegando que a acusação era infundada.

A edição de hoje do Le Monde diz que François Hollande também foi enganado. Segundo o jornal, o presidente prometeu defendê-lo após uma conversa em que Cahuzac, dentro do palácio do Eliseu, jurou que a tal conta não existia.

Hollande vive uma erosão de popularidade. Mais da metade dos franceses o consideram um mau presidente, incapaz de fazer frente ao desemprego recorde (3,2 milhões de trabalhadores de braços cruzados, segundo o governo), ao endividamento público e ao deficit do Estado. As mentiras de Cahuzac se somam ao combo de irritação dos franceses com seu presidente.

O presidente foi realmente enganado pelo seu ministro do Orçamento ou ele protegeu Cahuzac sabendo que ele cometera fraude fiscal? Esta é a pergunta que ressoa na imprensa francesa e que a oposição martela desde ontem.

“Quem pode acreditar hoje que François Hollande e [o primeiro-ministro] Jean-Marc Ayrault não sabiam de nada?”, disparou o presidente da UMP (centro-direita), Jean-François Copé, à “Europe 1”. “É preciso que eles dêem explicações aos franceses”.

Na mesma linha foi vice-presidente da Frente Nacional (extrema-direita), Florian Philippot: “Se um jornalista era capaz de saber que o ministro tinha contas no exterior, como o chefe de Estado podia não saber?”, indagou.

Não há cenário positivo para Hollande: se foi enganado, pode ser visto como um presidente omisso que escolhe mal seus homens de confiança; se sabia, tornou-se cúmplice do ministro sonegador e avalista de uma “espiral de mentiras” – para usar a expressão usada pelo próprio Cahuzac em seu blog.

PS: Em vez de reclamar da imprensa que revelou o escândalo, o Partido Socialista francês anunciou, hoje, a expulsão de Cahuzac.

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O drone jornaleiro

Por grocha
02/04/13 10:41

Para quem nunca entendeu direito o princípio de funcionamento do telefone, o fax sempre foi um mistério. Ou o smartphone, o tablet, o air-bag, a pipoca de micro-ondas etc.

Não é de se estranhar que gente como eu (perdida no século errado) quase tivesse uma síncope ao ler no site da prestigiosa revista americana “The Atlantic” que a estatal francesa de correio, iniciaria testes com o uso de drones – aqueles aviões não tripulados – para realizar a entrega diária dos jornais aos assinantes da pequena cidade de Auvergne. Aqui o texto (em inglês).

Você está em casa quando chega um robozinho voador e entrega o seu jornal do dia. Sei lá se acabaria com as previsões pessimistas sobre o futuro do papel impresso, mas seria um grande passo: um admirável mundo novo à prova de cachorro e de vizinho ladrão, grandes inimigos dos assinantes de jornal.

Bom demais para ser verdade, não é?

Liguei para o fabricante dos drones hoje e a assessora de imprensa candidamente me informou que era uma blague de 1º de abril. Senti um calafrio na hora, ao pensar na repórter da The Atlantic que acreditou na brincadeira e publicou. Com foto e tudo.

A brincadeira é tão popular que muitas empresas aderem. A empresa de correio publicou a pegadinha dos drones no seu blog institucional.

A repórter Lúcia Müzell, uma amiga que vive em Paris há vários anos, me disse que os franceses estão acostumados e até esperam pelas blagues. A imprensa francesa faz parte da brincadeira, mas algumas publicações estrangeiras caem bonitinho.

Coisas que não saem de moda nunca: os Rolling Stones, o dry martini e checar a informação antes de publicar.

Algumas bastante esdrúxulas:

Primeira-dama censurada: a jornalista Valerie Trierweiller teve uma crônica literária censurada por apresentar detalhes picantes de sua vida conjugal com o presidente François Hollande. Segundo o site Rue 89, o texto seria uma espécie de “Cinquenta Tons de Cinza” e a assessoria de imprensa da Presidência agiu para impedir a publicação.

Sarkozy e Carla Bruni na Bélgica: enrolado com o processo de suposto financiamento ilegal de sua campanha em 2007, o ex-presidente Nicholas Sarkozy e sua mulher, Carla Bruni, estariam de malas prontas para se mudar para a Bélgica.

Nova Bond Girl: A ex-ministra da Saúde Rosalyne Bachelot, 66, anunciou numa entrevista que, após “muita insistência” do ator Daniel Craig, encarnaria o par romântico do agente 007 no próximo filme da série.

Vogais pagas: O Twitter “informou” que passaria a cobrar separadamente pela publicação das vocais A, E, I, O, U. A letra Y permaneceria grátis. O Google lançou o serviço de busca olfativa.

Pandas exilados: O canal France 3 informou que os governos da França e da China fecharam um acordo para povoar um parque natural dos Pirineus com pandas gigantes. Segundo um “especialista”, a migraçao é possível graças ao aquecimento global que tornou as montanhas da fronteira França/Espanha mais quentes para abrigar os ursos em extinção na China.

Aqui o balanço do jornal Le Parisien com as brincadeiras do 1º de abril na França. (em francês)

Crédito da foto: La Poste

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O presidente em seu labirinto

Por grocha
29/03/13 13:15

Durante a longa entrevista que concedeu ontem ao canal de TV France 2, François Hollande pediu aos franceses exatamente aquilo que eles parecem cada vez parecem menos dispostos a conceder ao seu presidente: paciência.

O cansaço dos franceses com o socialista se expressa nas pesquisas de opinião: para 51%, ele não é um bom presidente contra apenas 22% que consideram que ele cumpre o seu papel corretamente.

É muito pouco para quem chegou ao poder envolto em uma nuvem de enorme expectativa cujo símbolo foi a enorme multidão que tomou a Bastilha para comemorar o fim da presidência de Nicholas Sarkozy.

Ao lembrar que está governando “há dez meses, não há dez anos”, Hollande pediu para ser julgado pelos resultados de seu governo. “Meu dever é fazer a França sair da crise”, disse o presidente.

Na TV, fez dois anúncios:

1) Aplicará por dois anos a taxa de 75% para renda acima de um milhão de euros. A medida, que foi uma das suas bandeiras de campanha, já havia sido considerada inconstitucional em dezembro, mas Hollande a ressuscitou com roupa nova: apenas empresas e executivos serão taxados.

2) Fará uma reforma na previdência e nos subsídios às famílias. Não deu detalhes.

Hollande está acuado pelo desemprego galopante. Mais de 3,2 milhoes de trabalhadores estão sem emprego na França e os anúncios de planos de demissão pipocam pelo país, aumentando a instabilidade social em cidades de todo porte.

A multiplicação dos braços cruzados não é culpa exclusiva do atual governo já que as taxas de desemprego subiram em 52 dos últimos 60 meses no país, segundo o Insee (o IBGE francês). Hollande, entretanto, ainda não conseguiu mostrar os resultados. Por enquanto está sendo julgado pela falta deles.

O desemprego é o problema mais dramático, mas a França também tem dificuldades para conter o seu déficit e enfrenta um endividamento crescente.

A falta de competitividade da economia é um gargalo crítico para que o presidente cumpra a sua promessa de restaurar o emprego no país. O custo da mão-de-obra na França é superior ao da vizinha Alemanha, que cada vez mais se isola na liderança da Europa.

PS: Impossível não admirar um sistema político em que o presidente vai à televisão para responder perguntas e se sujeitar a críticas. Mostra algum respeito pelos eleitores fora do período de campanha eleitoral. Já no Brasil, aversão presidencial a entrevistas já se tornou, infelizmente, um dado da realidade cotidiana.

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Desilusão com sonho europeu alimenta extrema-direita na França

Por grocha
26/03/13 10:25

Olhando para a França inteira, o segundo turno da eleição parlamentar de Oise, grotão que tem somente 1% do eleitorado do país, nem deveria provocar grande comoção. Mas o desempenho exuberante da extrema-direita virou assunto da crônica política da semana.

Contados os votos, a UMP (União por um Movimento Popular), centro-direita tradicional, levou a melhor com apenas 51,41%, mas não comemorou. A Frente Nacional alcançou 48,59%. Depois de desbancar os socialistas no primeiro turno, teve um salto de 22 pontos percentuais no segundo.

A eleição vale menos por si mesma do que pela tendência que parece apontar: um crescimento lento e sustentável do partido de extrema-direita na França. Ou “a marcha incontestável de nossa chegada ao poder”, segundo as palavras otimistas de Marine Le Pen, presidente da FN.

Marine Le Pen foi ungida herdeira política do pai, Jean-Marie Le Pen, um ex-paraquedista que iniciou carreira como arruaceiro no pós-guerra. Quando disputou a presidência pela primeira vez em 1974, ele não teve nem 1% dos votos. Em 2002, numa eleição com abstensão atípica e com o Partido Socialista quebrado pela briga interna, Le Pen chegou ao segundo turno.

Jean-Marie Le Pen sempre negou a existência do Holocausto e sua única plataforma clara, em todas os pleitos disputados, era a disposição de expulsar todos os imigrantes do país. Em 2011, passou a liderança do partido para a filha.

Quando madame Le Pen mordeu 18% dos votos na eleição presidencial do ano passado, muita gente aqui se perguntou se quase um quinto dos franceses era xenófobo, mas a pergunta estava errada.

Marine não é bronca como o pai e é uma mulher carismática. Muito embora a utopia ultranacionalista da FN (que considera os imigrantes culpados pela decadência francesa), não tenha mudado, o que mudou, de fato, foi a França.

Com mais de 4 milhoes de desempregados, o país cada vez mais olha com desconfiança para os seus líderes tradicionais da centro-direita ou da esquerda socialista.

A crise da dívida – cuja lista de vítimas nos últimos dias passou a incluir o Chipre –  torna a cada dia mais plausível a hipótese do fracasso da Europa unida. Há alguns anos, a teoria dos Le Pen de que isso pudesse acontecer não era levada a sério por nenhum analista.

É o discurso antieuropeu de Marine Le Pen que empurra a extrema-direita para frente.

O grande teste da FN será a eleição municipal do ano que vem. E, diga-se a seu favor, Marine Le Pen é laboriosa porque desde que perdeu a eleição presidencial, ela praticamente não parou de correr o país.

Em meio à desesperança com o futuro europeu e o cansaço do eleitor com o revezamento de socialistas e da direita moderada, madame Le Pen busca se beneficiar do mesmo sentimento que, na Espanha, fez os jovens indignados exigirem “que se vayan todos”.

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A pergunta impertinente

Por grocha
13/03/13 07:04

Quem faz política ou a acompanha por interesse (ou dever de ofício, como os jornalistas) sabe que o impertinente solitário frequenta os piores pesadelos dos marqueteiros.

O folclore está cheio de causos em que um bêbado, sozinho, esquecido num canto, põe a perder semanas de planejamento, milhares de reais gastos para organizar um evento e horas de ensaio para domesticar um candidato.

Com uma única intervenção fortuita, fora do script, tudo pode dar errado para os gênios (bem pagos) do marketing. O impertinente ganha todos os holofotes e todo o esforço de relações públicas vai por água abaixo. Imprevisto e destruidor, como um raio em dia de céu claro.

A vida de François Hollande não anda nada fácil nesses dias. Pesquisas dizem que dois em cada três franceses desaprovam o governo socialista. O desemprego alcançou o nível mais alto desde 1999 e os anúncios de fechamento de fábricas se sucedem.

Alguém no Eliseu (sede da presidência da França) teve a ideia luminosa de tentar reverter a degradação da imagem presidencial com um giro pelo país.

Dijon, cidade famosa por sua mostarda, foi escolhida como a primeira da agenda em que o “presidente normal”, marca cuidadosamente construída na campanha eleitoral, voltaria a se encontrar com as pessoas normais.

Tudo corria bem até que…

– Senhor Hollande, elas estão onde, suas promessas? – gritou um homem a poucos passos do presidente.

Ato contínuo: enquanto Hollande entrava em uma loja, dois guarda-costas agarraram o homem, como se bloqueassem um jogador de futebol americano, e o levaram para longe. Foi revistado e interrogado. Clique aqui parra ver a cena no Youtube.

Exceto pela própria impertinência, o homem não estava armado. Foi liberado em seguida.

Aparentemente, não foi uma armadilha. O impertinente é ligado a um sindicato, simpatizante socialista, e morador do bairro por onde Hollande passeava (onde a taxa de desemprego campeia 32%).

A cena fez a delícia do “Petit Journal”, programa campeão de audiência noturna do Canal+ por ironizar personagens públicos do noticiário do dia. Aqui o programa, o caso ocupa os primeiros 10 minutos (em francês).

A imagem do rapaz sendo arrancado, manu militari, do cortejo presidencial esteve em todos os telejornais da noite de ontem e é mencionada em praticamente todos os jornais de hoje.

Os seguranças do presidente foram rápidos para bloquear o impertinente. O problema é que a pergunta que ele fez – “onde estão suas promessas?” – ronda a cabeça de um número crescente de franceses.

O que foi mesmo que Hollande foi fazer em Dijon?

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Sarkozy reaparece quando desemprego bate recorde na França

Por grocha
07/03/13 09:21

Quase dez meses depois de deixar a presidência, Nicolas Sarkozy declarou que pode voltar para a política se for para empurrado pelo “dever”. As declaraçoes do ex-presidente conservador estão na edição da revista “Valeurs Actuelles” que chegou às bancas hoje.

Na conversa com a revista, parte dela ocorrida no estádio do Paris Saint-Germain, Sarkozy disse que uma possível volta não seria questão de vontade própria, mas de falta de escolha em um momento “pouco glorioso” para a França.

“Estou feliz levando minha filha para a escola e dando conferências ao redor do mundo (…) mas se for obrigado [a voltar à política] não será por desejo, mas por dever. Apenas porque se trata da França”, disse. Veja a íntegra do texto (em francês).

Sarkozy colocou a cabeça para dentro da arena política em um momento bem escolhido. Seu sucessor, o socialista François Hollande, é o presidente mais mal-avaliado na história da 5ª República (iniciada por De Gaulle em 1958).

Somente 37% dos franceses dizem aprovar a presidência de Hollande, segundo pesquisa do instituto Ifop, contratada pela revista “Paris Match”, publicada ontem. Outra pesquisa, encomendada pelo jornal “Le Figaro” e divulgada no final de semana, diz que a taxa de aprovação é de apenas 30%.

Hoje, o canal BFMTV divulgou os dados de uma pesquisa encomendada junto ao instituto BVA-Axys Consultants. A sondagem aponta que três em cada quatro franceses não acredita em melhoras na economia francesa no futuro próximo. Veja os resultados aqui.

Não é difícil entender o pessimismo disseminado. Na manhã de hoje, o Insee (versão francesa do IBGE) apontou que o desemprego fechou o ano passado em 10,2% da força de trabalho – índice mais alto desde 1999. Os dados aparecem neste link.

Se a estatística é fria por si só, todos os canais de TV locais mostram imagens do confronto de hoje entre policiais e trabalhadores de uma fábrica da Good-Year que será fechada no conturbado subúrbio de Amiens-Nord. A situação já foi tema do blog (clique aqui e aqui).

Se as pesquisas apontam desilusão do eleitorado com o atual presidente, a direita francesa tampouco foi capaz de apresentar um nome capaz de capitalizá-la.

A UMP, partido de centro-direita de Sarkozy, rachou numa luta interna e espalhou cacos para todos os lados.

A recente eleição interna terminou com jeito de pastelão com os dois candidatos ao comando da sigla – Jean-François Copé, ex-secretário do partido, e o ex-primeiro-ministro François Fillon – se acusando mutuamente de trapacear a disputa.

Após a recontagem dos votos, Copé levou a melhor. Fillon corre a França para se fortalecer nas bases em busca da candidatura presidencial de 2017.

Não se sabe se o “dever” vai mesmo empurrar Sarkozy para uma nova disputa.

O que se deduz da entrevista, por enquanto, é que o ex-presidente tirou uma casquinha do mau momento político de Hollande ao mesmo tempo em que enquadrou os brigoes da UMP.

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O Brasil não é um peru com farofa para investidores

Por grocha
02/03/13 09:29

O Brasil ainda é atraente, mas está a anos-luz longe de ser um peru com farofa para os investidores internacionais. Estava ontem em Londres, um dos melhores lugares do mundo para observar como o capital internacional enxerga o Brasil, justamente no momento em que o IBGE divulgou o pibinho de 0,9%.

A ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, participavam de um seminário sobre o programa de concessões para 300 empresários e executivos de bancos, fundos de investimento e companhias de infraestrutura. (aqui a reportagem da Folha sobre o assunto.)

Gleisi bateu várias vezes na tecla de que o Brasil é um país com segurança jurídica, que cumpre contratos e que estimula a entrada de capital externo.

O discurso da ministra foi uma tentativa de “reciclar” a imagem do país junto a investidores e recuperar um pouco da aura de destino seguro e lucrativo. Guido Mantega já havia feito um giro muito parecido no ano passado, quando se reuniu com investidores em Londres e em Paris.

O país continua sendo um dos maiores mercados consumidores em expansão no mundo, com uma demanda gigantesca por infraestrutura e serviços e estabilidade democrática, mas perdeu a aura de oásis onde a crise internacional chegava na forma de “marolinha”.

Nos últimos anos, o crescimento baixo do PIB, a não renovação automática das concessoes do setor elétrico ou a intervenção do governo na Petrobras suscitaram muitas críticas e fizeram desbotar a famosa capa da revista britânica “The Economist”, que retratou o país com a imagem de um Cristo Redentor decolando como um foguete.

Há percepções distintas sobre o governo Dilma Rousseff, conforme o ramo de atividade de quem estava no seminário de ontem. A grita é maior no mercado financeiro do que no setor de infraestrutura.

De um analista de um grande banco europeu, que pediu para não ter o nome divulgado, sobre a insistência de Gleisi Hoffmann em frisar a segurança jurídica no Brasil. “Quando você é fiel a sua mulher, você não precisa ficar o tempo todo dizendo isso. Se precisa ficar dizendo é porque tem algo errado”, comparou.

Ele prosseguiu com o raciocínio: “Tecnicamente o Brasil não quebrou nenhum contrato ao obrigar as empresas do setor elétrico a reduzir seu lucro para renovar concessões, mas surpreendeu todo mundo. Houve também a intervenção nos juros, com a Caixa e o BB, ou a política de segurar preços dos combustíveis. O que a gente se pergunta é qual é a próxima surpresa”.

No corredor do elegante hotel Landmark, durante o coffee break, um executivo brasileiro que trabalha em um banco de investimentos sediado em Nova York explicava a um interlocutor suas inquietações: “Quando o banco põe dinheiro no Brasil ou em qualquer lugar, não importa qual é o pacote (onde se vai investir), a única coisa o que ele quer é o dinheiro de volta e lucro depois”.

O mantra dos banqueiros contra o intervencionismo do governo não encontra eco entre as empresas que lidam diretamente com infraestrutura, como empreiteiras e fornecedores de equipamentos para empresas de petróleo e enegia.

Rafael Bovani, executivo da empresa inglesa Cargostore (óleo e gás), diz que Dilma tem uma boa imagem junto ao empresariado britânico, mas a bucrocracia do país é um entrave concreto.

“O que assusta muito é a produtividade do Brasil. Tudo para se fazer no Brasil é muito difícil, a mão de obra é complicada. O que você faz com um trabalhador aqui, no Brasil você precisa de cinco. Isso é o pior do país”, diz.

Mauricio Endo, da gigante global de consultoria KPMG, diz que houve uma guinada na maneira como o governo federal passou a lidar com o capital privado.

Segundo ele, a abertura do Brasil a investimentos internacionais, com uma estrutura de financiamento própria (BNDES), pode ser uma boa resposta ao déficit de portos, aeroportos, estradas e ferrovias do país.

“Houve uma quebra de paradigma do governo do PT com relação a questão das concessões, de atrair o capital privado para investir. Isso é importante porque antes eram os Estados que estavam liderando essa agenda e o governo federal estava um pouco refratário”, disse.

“O governo mostrou as caras e abriu o país para esse tipo de investimento e isso tem um impacto muito maior do que, por exemplo, o Estado de São Paulo vir aqui e falar sobre investimentos no estado”, declarou.

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Morre o embaixador dos indignados

Por grocha
27/02/13 08:56

O veterano diplomata Stéphane Hessel morreu na noite de ontem, em Paris, aos 95 anos. Ícone da esquerda francesa, Hessel ganhou notoriedade fora da França nos últimos anos pelo best-seller “Indignez-Vous” (“Indignai-vos”), um panfleto de 32 páginas que conclamava à revolta contra a financeirização do mundo.

Mas Hessel teve uma vida singular. Foi um desses personagens raros cuja própria vida se confundiu com os fatos históricos da Europa e do Ocidente por quase um século.

Nascido em Berlim em 1917, penúltimo ano da 1ª Guerra Mundial, Hessel se tornou francês 20 anos depois. Seus pais fugiram da Alemanha por causa da ascensão dos nazistas ao poder. A família se instalou em Paris.

Sua mãe inspirou a personagem Catherine no romance “Jules e Jim”, de Henri-Pierre Roché, história que seria imortalizada numa das mais belas obras da Nouvelle Vague pelo cineasta François Truffault. O pai havia traduzido, junto com o filósofo Walter Benjamin, obras de Marcel Proust para o alemão.

Na 2ª Guerra Mundial, engajou-se, de fato, na Resistência contra a ocupação nazista da França. Era uma exceção heróica em um país cuja população aderiu passivamente – ou até mesmo com entusiasmo – aos alemães. Preso em 1944, foi enviado ao campo de Buchenwald.

Libertado ao final da guerra, voltou para a França e iniciou carreira diplomática. Integrou a equipe de redatores da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). O trabalho renderia o apelido “Sr. Direitos Humanos” que o acompanharia até o final da vida na França. Em 2006, recebeu a Legião de Honra, a mais alta distinção concedida pelo estado francês.

Ícone da esquerda, Hessel era um defensor apaixonado da ideia de uma Europa unida como antídoto para as tragédias do século 20. Passou a defender causas pouco populares na França, como o destino dos dos sans papiers – como são eufemisticamente chamados os imigrantes ilegais.

Em 2010, escreveu “Indignez-vous”, esbravejando contra as políticas de austeridade que pipocavam nos países europeus após a crise de 2008. O texto é um convite à desobediência civil que, em nenhum momento, esclarece como isso ajudaria a superar a crise.

Mesmo assim, foi um sucesso instantâneo e virou uma espécie de certidão de nascimento para os jovens espanhois, que em uma grande manifestação em março de 2011, batizaram a si próprios de “los indignados”.

Era um incendiário na política e uma figura afável no trato pessoal. Era de uma geração de intelectuais que ainda era capaz de recitar poemas de Shakespeare de memória, como fez ao final de um encontro com Dalai-Lama, em 2011.

PS: Clique aqui para ler um perfil de Stéphane Hessel, escrito por Leneide Duarte-Plon, publicado pela Ilustríssima, em 2011.

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