Mentiras de ex-ministro geram nova crise para Hollande
03/04/13 04:56A confirmação de que o ex-ministro do Orçamento, Jérôme Cahuzac, mantém 600.000 euros escondidos em uma conta no exterior abriu uma crise com alto potencial de estrago para o presidente da França, François Hollande.
Comparado ao ex-ciclista Lance Armstrong pelo desembaraço com que mentia diante de câmeras e microfones, Cahuzac caiu em desgraça e foi abandonado pelos colegas do Partido Socialista e é fustigado pela oposição à direita e à esquerda.
Em nota, o palácio do Eliseu (sede da presidência) disse que as mentiras são uma “grave falta moral”. Como ministro do Orçamento, Cahuzac era também o responsável por elaborar políticas de combate às fraudes fiscais que ele próprio cometia.
Cahuzac deixou o cargo no mês passado, mas apenas ontem admitiu ser o titular do dinheiro que circulou numa conta do UBS na Suíça e depois em um banco de Cingapura. Após ser indiciado por lavagem de dinheiro, o ex-ministro pediu perdão e disse estar “devastado pelo remorso” em seu blog.
O caso veio à tona em dezembro, revelado pelo jornal digital Mediapart. Na Assembleia Nacional, Cahuzac negou a existência da conta no exterior e prometeu processar quem divulgou a informação. Nas entrevistas que concedeu, o então ministro subia o tom para se defender alegando que a acusação era infundada.
A edição de hoje do Le Monde diz que François Hollande também foi enganado. Segundo o jornal, o presidente prometeu defendê-lo após uma conversa em que Cahuzac, dentro do palácio do Eliseu, jurou que a tal conta não existia.
Hollande vive uma erosão de popularidade. Mais da metade dos franceses o consideram um mau presidente, incapaz de fazer frente ao desemprego recorde (3,2 milhões de trabalhadores de braços cruzados, segundo o governo), ao endividamento público e ao deficit do Estado. As mentiras de Cahuzac se somam ao combo de irritação dos franceses com seu presidente.
O presidente foi realmente enganado pelo seu ministro do Orçamento ou ele protegeu Cahuzac sabendo que ele cometera fraude fiscal? Esta é a pergunta que ressoa na imprensa francesa e que a oposição martela desde ontem.
“Quem pode acreditar hoje que François Hollande e [o primeiro-ministro] Jean-Marc Ayrault não sabiam de nada?”, disparou o presidente da UMP (centro-direita), Jean-François Copé, à “Europe 1”. “É preciso que eles dêem explicações aos franceses”.
Na mesma linha foi vice-presidente da Frente Nacional (extrema-direita), Florian Philippot: “Se um jornalista era capaz de saber que o ministro tinha contas no exterior, como o chefe de Estado podia não saber?”, indagou.
Não há cenário positivo para Hollande: se foi enganado, pode ser visto como um presidente omisso que escolhe mal seus homens de confiança; se sabia, tornou-se cúmplice do ministro sonegador e avalista de uma “espiral de mentiras” – para usar a expressão usada pelo próprio Cahuzac em seu blog.
PS: Em vez de reclamar da imprensa que revelou o escândalo, o Partido Socialista francês anunciou, hoje, a expulsão de Cahuzac.