A pergunta impertinente
13/03/13 07:04Quem faz política ou a acompanha por interesse (ou dever de ofício, como os jornalistas) sabe que o impertinente solitário frequenta os piores pesadelos dos marqueteiros.
O folclore está cheio de causos em que um bêbado, sozinho, esquecido num canto, põe a perder semanas de planejamento, milhares de reais gastos para organizar um evento e horas de ensaio para domesticar um candidato.
Com uma única intervenção fortuita, fora do script, tudo pode dar errado para os gênios (bem pagos) do marketing. O impertinente ganha todos os holofotes e todo o esforço de relações públicas vai por água abaixo. Imprevisto e destruidor, como um raio em dia de céu claro.
A vida de François Hollande não anda nada fácil nesses dias. Pesquisas dizem que dois em cada três franceses desaprovam o governo socialista. O desemprego alcançou o nível mais alto desde 1999 e os anúncios de fechamento de fábricas se sucedem.
Alguém no Eliseu (sede da presidência da França) teve a ideia luminosa de tentar reverter a degradação da imagem presidencial com um giro pelo país.
Dijon, cidade famosa por sua mostarda, foi escolhida como a primeira da agenda em que o “presidente normal”, marca cuidadosamente construída na campanha eleitoral, voltaria a se encontrar com as pessoas normais.
Tudo corria bem até que…
– Senhor Hollande, elas estão onde, suas promessas? – gritou um homem a poucos passos do presidente.
Ato contínuo: enquanto Hollande entrava em uma loja, dois guarda-costas agarraram o homem, como se bloqueassem um jogador de futebol americano, e o levaram para longe. Foi revistado e interrogado. Clique aqui parra ver a cena no Youtube.
Exceto pela própria impertinência, o homem não estava armado. Foi liberado em seguida.
Aparentemente, não foi uma armadilha. O impertinente é ligado a um sindicato, simpatizante socialista, e morador do bairro por onde Hollande passeava (onde a taxa de desemprego campeia 32%).
A cena fez a delícia do “Petit Journal”, programa campeão de audiência noturna do Canal+ por ironizar personagens públicos do noticiário do dia. Aqui o programa, o caso ocupa os primeiros 10 minutos (em francês).
A imagem do rapaz sendo arrancado, manu militari, do cortejo presidencial esteve em todos os telejornais da noite de ontem e é mencionada em praticamente todos os jornais de hoje.
Os seguranças do presidente foram rápidos para bloquear o impertinente. O problema é que a pergunta que ele fez – “onde estão suas promessas?” – ronda a cabeça de um número crescente de franceses.
O que foi mesmo que Hollande foi fazer em Dijon?
Graciliano, parabéns, texto interessante e gostoso de ler. beijo!